Há um tempo atrás, quando ainda adolescente, costumava tratar algumas pessoas amigas da família como senhora, professora, ou qualquer outro título que lhes coubesse. Depois, o tempo matreiro foi passando, ou eu passando por ele, e já estranhava tanta deferência com as pessoas com as quais minha família se relacionava. Então, simplesmente, eliminei os cumprimentos, pois eu crescera e elas já pareciam mais amigas minhas do que de meus familiares.
Depois, uma época chegou em que os mais jovens começaram a tratar-me com um certo respeito, chamando-me dona Layze. Até aí tudo bem! Eu nada percebia das mudanças ocorridas em meu corpo. Considerava-me jovem ainda; era bonito esse tratamento respeitoso e eu até pensava que estava ficando importante!
Mais tarde, afastando-me de Juazeiro e passando a residir em Salvador, ao retornar após dez anos, as crianças aqui deixadas já eram adolescentes e estas, gentilmente, chamavam-me “tia”. Algumas até perguntavam: “tia”, não lembra de mim? Sou filha de... e citavam o nome da mãe. Até aí, tudo continuava bem! Eu nada percebia! Despertar e enxergar as mudanças que o tempo operou em mim só aconteceu no dia em que, estando na fila, em um Banco, para fazer um saque no caixa eletrônico, alguém me alertou: “Dona, a senhora tem direito de passar na frente dos outros”. Agradeci e acrescentei; “- Eu sei, mas eu posso esperar”. Passados alguns minutos o rapaz insistiu: “- Dona, se não quer passar na frente dos outros com medo de que a repreendam, por que na vai na fila dos idosos?” Surpresa com tanta insistência, tive vontade de perguntar se o estava incomodando. Já em casa e relembrando o ocorrido, caí na realidade. O tempo modificara meu rosto e eu não notara ou fingia não notar. Lembrei que as crianças menores não me tratam mais por tia; chamam-me vovó e acordei para a realidade. Meu Deus! Estou envelhecendo! O tempo passou sem que eu percebesse!
É tudo tão sutil que nem sentimos nosso corpo se desenvolvendo, os dias expirando, nosso rosto sofrendo alterações: uma ruga aqui, outra ali, a boca tomando outro formato, a sobrancelha caída. E não adianta contestar. Como diz a canção, “é a lei do tempo que ficou p’ra trás, levando momentos que não voltam mais”.
Resta-nos apenas o consolo da saudade e a esperança de que, cada transformação operada em nosso corpo e assimilada por nosso espírito nos dê lições de perdão, exemplos de altruísmo, conduzindo-nos à maturidade e sabedoria. Então, ao pronunciarmos a célebre frase “meu Deus, estou envelhecendo”, podemos sorrir, pensando: “E daí? É a lei do tempo! Cumpre-nos acatá-la.”
Layze de Luna Britto